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Um acordo internacional para restringir a venda de alimentos
ultraprocessados pode ajudar a combater a obesidade e a hipertensão –
associadas a problemas graves de saúde. A avaliação é de especialistas que se
reuniram na Conferência Mundial de Promoção da Saúde, esta semana, em Curitiba.
Inspirada nos marcos legais que impuseram restrições à venda de tabaco e de
bebidas alcoólicas, uma convenção poderia colocar limites à publicidade –
principal responsável pelo aumento do consumo produtos na América Latina, de acordo
com os cientistas.
Os alimentos ultraprocessados são aqueles industrializados
prontos ou quase prontos para comer, como pizzas, lasanhas, salgadinhos,
biscoitos recheados, macarrão instantâneo, nuggets (frango empanado), embutidos
e refrigerantes. Para que não estraguem e tenham boa aparência, passam por
procedimentos que retiram nutrientes naturais e alteram a composição.
Uma das estratégias para diminuir a procura desses itens
deve ser a restrição da publicidade, defende a coordenadora do Núcleo de Alimentação
e Nutrição Escola da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Inês Rugani. Ela
explica que as empresas concentram investimentos em marketing, para convencer
as pessoas, principalmente as crianças, a consumir. Outro desafio, acrescenta,
é incluir avisos de advertência na parte da frente dos rótulos, como ocorre com
o cigarro.
“A parte da frente do rótulo é tida pelas empresas apenas
como um espaço de comunicação com o cliente, para peças de publicidade, que ora
confundem ora trazem mensagens enganosas. No caso de produtos infantis,
bonequinhos, essas coisas encorajam o consumo”, alertou.
Segundo ela, na Inglaterra, pesquisas provam que as crianças
chegam a afirmar que o sabor dos alimentos muda conforme o rótulo. Aqueles
associados às grandes redes têm a preferência. “Quando você tem o Shrek em
algum produto infantil, se o seu filho viu o filme do Shrek, ele quer aquele,
mesmo sendo igual ao que não tem. E prova [o alimento] e acha mais gostoso
porque o Shrek está ali na frente”, acrescentou Inês, ao relacionar os
ultraprocessados à crescente obesidade infantil no país.
Lobby da indústria
A pesquisadora Ana Paula Bortolettto, do Instituto
Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), acrescenta que um marco
internacional é instrumento com capacidade de ajudar os países a terem mais
força diante do lobby da indústria de alimentos. Ela conta que empresas
recorrem à Justiça e a organizações internacionais para evitar qualquer forma
de regulamentação.
“Hoje, empresas têm mais poder que os países, impondo dificuldades
para a implementação de políticas públicas que tenham como objetivo prevenir a
obesidade e melhorar a alimentação”, disse ela, que também integra a Coalizão
Latino-Americana Saudável.
Segundo Ana Paula, a coalização conversa com a Organização
Pan-Americana da Saúde (Opas) e organizações da sociedade para discutir se a
convenção pode se limitar à América Latina.
Como o consumo desses produtos chegou ao limite nos países
mais ricos, as empresas se voltam para o Hemisfério Sul, com estratégias agressivas,
como a publicidade e o lobby, disse o assessor de Nutrição e Atividades Físicas
da Opas Fábio Gomes. Ele confirmou que vários países do bloco discutem os
benefícios de um marco legal internacional e denunciam a interferência da
indústria de alimentos nas políticas públicas.
Obesidade
Estimativas da Opas apontam que, em uma década, o consumo de
ultraprocessados aumentou 30%, por pessoa, em países latino-americanos,
enquanto cai na América do Norte.
A obesidade alcança 8,4% dos jovens brasileiros entre 12 e
17 anos. Além disso, 17% deles estão acima do peso ideal, segundo o Estudo de
Riscos Cardiovasculares em Adolescentes (Erica), do Ministério da Saúde. O
levantamento também mostra que um em cada cinco adolescentes hipertensos, cerca
de 200 mil, poderia não ter esse problema caso não fosse obeso. O levantamento
foi feito de 2013 para 2014, com base em entrevistas a 85 mil adolescentes de
escolas públicas e privadas de 124 municípios acima de 100 mil habitantes.
Indústria
Procurada pela Agência Brasil, Associação Brasileira
das Indústrias da Alimentação (Abia) informou que trabalha com o governo para
“desenvolver iniciativas focadas na saudabilidade e no bem-estar da população”.
Cita a participação no Plano Nacional de Vida Saudável, documento que orienta a
população a não consumir ultraprocessados e que faz críticas à publicidade dos
produtos.
“É preciso implantar programas educativos para que os
consumidores possam escolher os alimentos e compreendam a importância de aliar
nutrição equilibrada e prática de atividades físicas”, acrescenta a nota.
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