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A morte da jovem de 28 anos Alyne da Silva Pimentel
Teixeira, grávida de seis meses, por falta de atendimento adequado na rede
pública de saúde levou o Brasil a ser condenado internacionalmente pelo Comitê
para Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra Mulheres (Cedaw) das
Nações Unidas (ONU). O caso, ocorrido na Baixada Fluminense há quase 13 anos,
fez a Corte determinar uma série de recomendações ao Brasil para diminuir os
números de morte materna.
Para a médica Jurema Werneck, integrante da organização não
governamental Criola, a discriminação foi um dos fatores que levou à condenação
do Brasil pela Cedaw. Mas, segundo ela, pouco mudou nos últimos 13 anos.
“Quando o processo de Alyne resultou em sanções, esperávamos
que o Brasil aprendesse algo, esperávamos, pelo menos, que outras jovens não
passassem por isso, mas Rafaela passou”, destacou, lembrando o caso da jovem
Rafaela Cristina de Souza Santos, 15 anos, que morreu em abril deste ano ao dar
à luz em um hospital da prefeitura do Rio.
“Como se explica ela fazer pré-natal e morrer de eclâmpsia
[problema que poderia ser evitado com procedimentos diferenciados]? As duas
morreram da mesma coisa: negligência, causada pelo racismo [institucional].”
As duas gestantes faziam parte do que o Comitê de Prevenção
à Morte Materna do Estado do Rio de Janeiro – órgão responsável por investigar
as mortes e apontar mudanças práticas – considera grupo de risco. Ambas eram
negras, pobres e jovens, o grupo de mulheres que mais morre por complicações
durante o parto no estado.
As duas procuraram atendimento e morreram em um hospital.
Rafaela teve pressão alta – que na gestação é chamada de eclâmpsia – passou por
uma histerectomia (procedimento em que o útero ou parte do útero é retirada) e
teve uma série de complicações. Já Alyne, grávida de seis meses, perdeu o bebê
depois de aguardar atendimento por horas e morreu logo depois de entrar em
coma.
A coordenadora do Comitê de Prevenção à Morte Materna do
Rio, Tizuko Shiraiwa, explica que as investigações sobre os casos de óbito
melhoraram nos últimos anos. Hoje, no estado onde uma mulher grávida morre a
cada dois dias, já se sabe que 40% dos óbitos são causados por hipertensão,
verificada no caso de Rafaela; por hemorragias, como ocorreu com Alyne; e por
infecções e abortos inseguros. Ela reconhece, entretanto, que o atendimento
deixa lacunas.
“Temos falhas desde o pré-natal, na identificação precoce da
hipertensão, por exemplo, até as intercorrências na hora do parto”, citou. A
solução, avalia, é a capacitação dos recursos humanos e a difusão de boas
práticas no atendimento.
O comitê também destaca que os dois casos, pelo perfil das
vítimas, deveriam ter sido tratados com a máxima atenção desde o pré-natal e do
início das consultas que podem identificar complicações na gestação. A
mortalidade entre as mulheres grávidas de cor preta é sete vezes maior que as
de pele branca. Em geral, segundo o Ministério da Saúde, mulheres negras
recebem ainda menos tempo de atendimento do que uma mulher branca.
A morte de Rafaela Cristina de Souza está sendo investigada
pela prefeitura do Rio de Janeiro, que não comenta o caso, assim como o
Ministério da Saúde. Em maio, mais de 80 organizações de direitos humanos
fizeram uma carta pública cobrando responsabilidades pela morte da jovem.
A família de Alyne Pimentel também aguarda justiça. A Casa
de Saúde Nossa Senhora da Glória, onde a jovem fez um parto induzido depois de
descobrir que o feto de seis meses já estava morto, permanece conveniada ao
sistema público. À época, a unidade não contava com banco de sangue, unidade de
terapia intensiva ou ambulância. Esses equipamentos poderiam ter salvado a vida
da jovem, na avaliação da advogada do caso, Beatriz Galli. “A morte da Alyne
foi desencadeada por vários fatores que terminaram tragicamente”, destacou
Beatriz, que é integrante do Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa
dos Direitos da Mulher (Cladem).
O caso de Alyne é julgado pelo Tribunal de Justiça do Rio
que analisa um pedido de indenização para a filha dela que à época tinha seis
anos. A menina foi criada pela avó, faxineira. O processo aguarda relatoria da
desembargadora Norma Suely Fonseca Quintes.
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