Em
2012, 112.709 pessoas morreram em situações de violência no país, segundo o Mapa
da Violência 2014, divulgado hoje (2). O número equivale a 58,1 habitantes a
cada grupo de 100 mil, e é o maior da série histórica do estudo, divulgado a
cada dois anos. Desse total, 56.337 foram vítimas de homicídio, 46.051, de
acidentes de transporte (que incluem aviões e barcos, além dos que ocorrem nas
vias terrestres), e 10.321, de suicídios.
Entre
2002 e 2012, o número total de homicídios registrados pelo Sistema de
Informações de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, passou de 49.695 para
56.337, também o maior número registrado. Os jovens foram as vítimas em 53,4%
dos casos, o que mostra outra tendência diagnosticada pelo estudo: a maior
vitimização de pessoas com idade entre 15 e 29 anos. As taxas de homicídio
nessa faixa passaram de 19,6 em 1980, para 57,6 em 2012, a cada 100 mil jovens.
Segundo
o responsável pela análise, Julio Jacobo Waiselfisz, coordenador da Área de
Estudos da Violência da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, ainda
não é possível saber “se o que ocorreu em 2012 foi um surto que vai terminar
rapidamente ou se realmente está sendo inaugurado novo ciclo ou nova
tendência”. Ele lista situações que podem ter gerado o aumento, como greves de
agentes das forças de segurança ou ataques de grupos criminosos organizados.
Uma
tendência já confirmada é a disseminação da violência nas diferentes regiões e
cidades. Entre 2002 e 2012, os quantitativos só não cresceram no Sudeste. As
regiões Norte e Nordeste experimentaram aumento exponencial da violência. No
Norte, por exemplo, foram registrados 6.098 homicídios em 2012, mais que o
dobro dos 2.937 verificados em 2002. O Amazonas, Pará e Tocantins tiveram o
dobro de assassinatos registrados no mesmo intervalo de tempo. No Nordeste, o
Maranhão, a Bahia e o Rio Grande do Norte mais que triplicaram os homicídios.
Na
década, o Sul e o Centro-Oeste tiveram incrementos percentuais de 41,2% e
49,8%, respectivamente. No Sudeste, a situação foi mais variada, com diminuição
significativa em estados importantes, como o Rio de Janeiro e São Paulo.
Já em Minas Gerais, os homicídios cresceram 52,3% entre 2002 e 2012.
As
desigualdades são vivenciadas entre as regiões e também dentro dos estados.
Nenhuma capital, em 2012, teve taxa de homicídio abaixo do nível epidêmico,
segundo o Mapa da Violência. Todas as capitais do Nordeste registraram
mais de 100 homicídios por 100 mil jovens. Maceió, a mais violenta, passou dos
200 homicídios. No outro extremo, São Paulo, com a menor taxa entre as
capitais, ainda assim registra o número de 28,7 jovens assassinados por 100
mil.
O
balanço da década mostra, contudo, que não é possível afirmar que há tendência
comum de crescimento. Entre 2002 e 2012, as capitais evidenciaram queda de
15,4%, com destaque para meados dos anos 2000, quando a redução foi mais
expressiva, o que, segundo o organizador, comprova que a situação pode ser
enfrentada com políticas públicas efetivas.
Em
cidades do interior, o número tem crescido. Jocobo disse que são especialmente
os municípios de pequeno e de médio porte os que têm sofrido com a nova
situação. Ele cita dois possíveis motivos para isso: por um lado, o
investimento financeiro em políticas públicas nos grandes centros urbanos, como
Rio e São Paulo, ajudaram a diminuir a violência. Por outro, houve o
desenvolvimento de novos polos econômicos no interior, que atraíram
investimentos e também criminalidade, “sem a proteção do Estado como nas outras
cidades”.
Se
o país precisará esperar alguns anos para verificar o comportamento das taxas
de homicídios, no caso dos acidentes de transporte há pouca ou quase nenhuma
dúvida, dado o crescimento dos registros, à revelia das leis de trânsito que,
na década de 1980, foram responsáveis pela redução desses acidentes.
As
principais vítimas, segundo o estudo, são os motociclistas. Em 1996, foram
1.421 óbitos. Em 2012, 16.223. A diferença representa cerca de 1.041% de
crescimento. Há “uma linha reta desde o ano de 1998, com um crescimento
sistemático de 15% ao ano”, conforme a pesquisa.
Segundo
o sociólogo responsável pela publicação, a situação é fruto “de um esquema
ideológico que apresentou a motocicleta como carro do povo, por ser econômica,
de fácil manutenção”. Assim, “em vez de se investir em transporte público, o
trabalhador pagaria sua própria mobilidade”. E mais, fez dela o seu trabalho,
seja como motoboy, entregador ou mototaxista, “em situação de escassa educação
no trânsito, pouca capacidade de fiscalização e baixa legislação”, avalia Julio
Jacobo Waiselfisz.
Ao
todo, foram registradas 46.051 mortes por acidentes de transporte em
2012, 2,4% a mais que em 2011. Os dados oficiais reunidos para o estudo
mostram que ocorreram, naquele ano, 426 mil acidentes com vítimas, que devem
ter ocasionado lesões em 601 mil pessoas. A situação “é muito séria e grave”,
alerta o autor do trabalho, que destaca que é preciso lembrar que “o cidadão
tem o direito a uma mobilidade segura e é obrigação do Estado oferecê-la”.
O
suicídio também teve aumento na taxa de crescimento. Diferentemente das outras
situações, a elevação vem se dando desde os anos 1980. Conforme o relatório, o
aumento foi 2,7% entre 1980 e 1990; 18,8%, entre 1990 e 2000; e 33,3%, entre
2000 e 2012. Nesse caso, a idade das pessoas envolvidas é também menos precisa.
Tanto jovens quanto idosos têm sido vítimas.
Com
a publicação do estudo, feito com o apoio da Secretaria de Políticas de
Promoção da Igualdade Racial, da Secretaria Nacional de Juventude e da
Secretaria-Geral da Presidência da República, espera-se, conforme o texto,
“fornecer subsídios para que as diversas instâncias da sociedade civil e do
aparelho governamental aprofundem sua leitura de uma realidade que, como os
próprios dados evidenciam, é altamente preocupante”.