Terminou
sem um acordo formal a audiência de conciliação realizada ontem pelo Supremo
Tribunal Federal (STF) para tentar resolver impasses em torno da adoção de
livros de Monteiro Lobato pela rede pública de ensino.
O
assunto está sob análise do STF porque o Instituto de Advocacia Racial e
Ambiental (Iara), uma entidade do movimento negro sediada no Rio de Janeiro,
protocolou um mandado de segurança sustentando, entre outros argumentos, que o
livro Caçadas de Pedrinho, do escritor paulista Monteiro Lobato (1882-1948),
contém "elementos racistas".
A
reunião de ontem, que contou com a participação de integrantes do Iara e do
Ministério da Educação (MEC), não conseguiu resolver completamente a pendência.
Ficou acertado que um novo encontro ocorrerá no próximo dia 25, no MEC. Nesse
encontro será discutida a implementação de medidas como o treinamento dos
professores que ministrarão aulas com base na obra de Monteiro Lobato.
Advogado
e diretor do Iara, Humberto Adami disse que as duas partes estão em negociação.
Se for fechado um acordo, o STF homologará a desistência do mandado de
segurança.
Adami
afirmou que, ao partir para a negociação, tanto o governo quanto o Iara
cederam. "Audiência de conciliação é isso. Você não pode chegar e dizer
que quer 100%. Tem de ceder para chegar a um ponto médio", afirmou o
advogado. Antes da audiência, Adami disse que o livro incentiva o bullying nas
escolas. "Não há ninguém, ao não ser o Ziraldo, que não vê traços racistas
na obra de Monteiro", disse.
Nessa
negociação, o governo aceitaria discutir a implementação das medidas que
envolvem, por exemplo, a capacitação dos professores para explicar aos alunos o
contexto em que a obra foi escrita. Quanto ao instituto, o recuo seria aceitar
a manutenção de um parecer do MEC que liberou a adoção dos livros desde que
fosse fixada a implementação das medidas.
Discussão.
Para o professor Paulo Vinícius Baptista, do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros
da Universidade Federal do Paraná (UFPR), "a obra tem conteúdo racista,
mas não é possível afirmar com segurança o tipo de dano às crianças no momento
da leitura".
Para
o escritor Ilan Brenman, autor de A Condenação de Emília: o Politicamente
Correto na Literatura Infantil, "não é possível a criança virar racista
lendo Caçadas de Pedrinho. Elas estão mais interessadas nas trapalhadas que na
cor de pele dos personagens". Opinião semelhante tem o membro da Academia
Brasileira de Letras (ABL), Ivan Junqueira: "Não se deve tomar nenhuma
providência com relação a eventuais traços racistas de obras da literatura
brasileira, senão não ficaríamos somente em Monteiro Lobato."