Os
aposentados que voltarem a trabalhar e continuarem contribuindo ao Instituto
Nacional do Seguro Social (INSS) podem pedir o recálculo do valor do benefício
da aposentadoria, sem ter de devolver à Previdência o montante recebido até
então. Essa foi a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em processos
julgados recentemente.
O
Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi) estima que
cerca de 40% dos aposentados ainda trabalhem e tenham o benefício passíveis de
recálculo. Essa possibilidade chama-se desaposentadoria. Ela leva em
consideração os valores pagos pelo beneficiário posteriormente ao momento da
aposentadoria. Com a inclusão desses novos pagamentos, o valor total a ser
recebido pode aumentar.
De
acordo com a advogada Sindnapi, Andrea Gato, a desaposentadoria só é válida a
segurados que ainda contribuem ao INSS. O cálculo varia caso a caso: depende da
média do valor da contribuição à Previdência antes e depois da aposentadoria –
por tempo de serviço ou de contribuição.
A
regra atual estabelece que a aposentadoria dos contribuintes do INSS seja
feita, em geral, de acordo a aplicação do fator previdenciário, segundo a
combinação de dois critérios: idade mínima (65 anos para homens e 60 anos para
mulheres) e tempo de contribuição (35 anos para homens, 30 anos para mulheres).
Antes
das recentes determinações do STJ, houve divergências nas decisões de juízes de
instâncias inferiores quanto aos valores a serem restituídos à Previdência,
caso os beneficiários passassem a ter direito a uma aposentadoria mais alta.
Com a jurisprudência estabelecida pelo STJ, os demais processos, em instâncias inferiores,
terão de receber o mesmo tratamento. A matéria ainda pode ser contestada no
Supremo Tribunal Federal (STF), em 2ª instância, tanto em casos individuais
quanto coletivos – por meio de associações ou sindicatos.
O
Sindicato Nacional dos Aposentados e advogados previdenciários acreditam que,
com o respaldo do STJ, a tese da não restituição dos valores recebidos ganhe
força para a análise do Supremo. De acordo com o STF, estima-se que mais de 1,7
mil processos em instâncias inferiores aguardem o posicionamento da Corte sobre
o assunto.
Esses
casos de desaposentadoria acabam chegando nas instâncias superiores da Justiça
porque o INSS entende que, depois de aposentados, os segurados não têm o
direito de corrigir os proventos, pois, a rigor, essa possibilidade não está
prevista em lei. O Ministério da Previdência informou à Agência Brasil que
irá aguardar a decisão final do Judiciário sobre o tema e que, neste tempo, vem
cumprindo as determinações da Justiça.
Pela
legislação atual, a Previdência Social não reconhece a renúncia de
aposentadoria aos seus beneficiários e mantém a contribuição ao instituto sem
qualquer contrapartida. A partir daí, os aposentados entram na Justiça para
contestar esse posicionamento.
A
lógica por trás disso é a de que o INSS tem um fundo contributivo, em que a
pessoa paga um montante durante determinado período para que receba um valor no
futuro, não necessariamente correspondente ao total que pagou – diferentemente
de fundos acumulativos, com planos de previdência complementar ou mesmo
poupanças.
O
segurado pode tanto contribuir ao longo da vida e receber, após a sua
aposentadoria, valor inferior à soma das parcelas que pagou; quanto receber um
total superior, como em casos de invalidez, morte, acidente, entre outros
casos.
De
acordo com o doutor em direito previdenciário e advogado Guilherme Carvalho, a
desaposentadoria sem a restituição do montante já recebido deverá ser um
estímulo para que o tempo de contribuição dos segurados aumente, retardando a
aposentadoria em si – que é um dos objetivos atuais da Previdência,
considerando a expectativa de vida da população, que aumentou, e a pressão
sobre as contas da União.
No
escritório de Carvalho, há aproximadamente 20 mil casos de desaposentadoria.
Recentemente, o governo manifestou preocupação com o impacto dessa
possibilidade sobre as contas da Previdência,
que, de acordo com o último balanço, referente a março, acumulou déficit de R$
5 bilhões.
De
acordo com Guilherme Carvalho, o ideal seria que a desaposentadoria fosse
regulamentada por lei, para evitar a ocorrência de processo e facilitar o
trâmite dos que chegassem à Justiça.
“O
fator previdenciário, que deveria servir de incentivo para postergar a
aposentadoria, na prática, tem sido mais eficaz apenas para reduzir o valor dos
benefícios previdenciários. A explicação para tal fato é a de que a legislação
brasileira permite que as pessoas aposentadas continuem trabalhando”, disse, em
nota, o diretor do departamento do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) do
Ministério da Previdência, Rogério Nagamine.
Concomitantemente
à decisão do STJ, tramita no Congresso um projeto de lei (PL) sobre
desaposentadoria. O texto do PL já passou pelo Senado e
a proposta poderia seguir direto à Câmara, sem ter de passar pelo plenário da
Casa. A ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, informou, no
entanto, que entrará com recurso para que a matéria seja deliberada no pleno.
Ainda não há previsão para que isso ocorra.
"O
objetivo da desaposentadoria é proporcionar ao beneficiário, que contribuiu a
vida toda, uma condição de vida mais digna. A aposentadoria é um benefício de
caráter alimentar, que provê a subsistência, então o intuito é sempre
proporcionar o direito mais vantajoso”, explicou a advogada previdenciária,
Mariana Ferreira Rojo.
Para
a advogada do Sindicato Nacional dos Aposentados, Andrea Gato, os possíveis
beneficiários irão fazer uma campanha de ações entre os aposentados para
aproveitar a decisão do STJ – e, possivelmente, uma futura decisão do STF.
Segundo Andrea, 40% dos aposentados associados ao sindicato continuam
trabalhando, mesmo depois de oficialmente inativos. “Estamos otimistas e
aguardando a decisão do Supremo. Esperamos que mantenham a decisão referente à não
devolução”, disse a advogada.
Não
há regra em relação a quem poderá ser beneficiado ou não pela desaposentadoria.
“Os cálculos têm de ser feitos caso a caso para ver se um novo benefício seria,
de fato, melhor. Se a pessoa continuar trabalhando, tem de continuar contribuir
com valor igual, próximo ou maior ao anterior para que exista essa
possibilidade”, explicou Andrea Gato.