Nos dias atuais, casos de pedofilia são cada
vez mais comuns. Pais que abusam de filhas, homens que abusam de meninos,
vizinhos que abusam de meninas, entre outros. Recentemente, a história de uma
menina de 13 anos que sofria abusos da professora de matemática ganhou a mídia.
Porém, casos de meninos assediados por mulheres, são mais incomuns, ou pelo
menos, pouco divulgados.
Com o objetivo de contribuir “para que o
mesmo não aconteça com outras famílias”, o produtor cultural Davi Castro, mineiro
de Belo Horizonte, hoje com 29 anos, resolveu contar sua história. Lançado em
setembro, o livro Tia Rafaela, traz a história do produtor, que afirma ter
sofrido abusos da professora de Educação Física entre os 11 e 19 anos.
“Hoje para mim é tranquilo poder falar do
assunto, porque eu tratei e trabalhei tudo isso que vivi”, conta. Escrever “foi
um processo que fez parte do meu tratamento comigo mesmo, do meu resgate, para
superar tudo isso”, completa.
O começo
Aos 11 anos, Davi, filho de uma família de
classe baixa da capital mineira, teve que se mudar junto com a irmã para a casa
do pai, pois a mãe havia conseguido um emprego em Florianópolis. “A ideia dela
era trabalhar, guardar um dinheiro e depois buscar os filhos”, explica.
Nessa época ele foi para uma nova escola, e
lá conheceu Rafaela, a quem chamava de Tia Rafaela. “E ali começou uma amizade,
ela começou a ganhar minha confiança e aos pouquinhos ela foi me trazendo para
perto dela. Me pedindo para acompanhá-la até a academia do marido, até a casa
dela”, diz. Depois que ela “ganhou a confiança” do menino, ela “partiu para a
sedução sexual e física”.
O primeiro contato entre os dois surgiu a
partir da “troca de uma bala”. Desde esse momento, Davi conta que ela pediu
para que ele não comentasse com ninguém, como fazem, segundo ele, a maioria dos
pedófilos. “Ela fazia as ameaças e a manipulação dela, o jogo dela foi muito
bem armado, muito bem feito”, relata com voz firme, como em um momento de
raiva.
“Ela fazia comigo tudo o que tinha vontade”
A partir daí, as investidas de Tia Rafaela
aumentaram e ela conseguiu levar o garoto para morar em sua casa, “me
apresentou uma certa qualidade de vida na qual eu não vivia”, diz.
Rafaela era casada, na casa morava o casal,
um filho deles – de um ano na época – e uma menina também de 11, que eles
diziam ser uma "sobrinha adotiva". Desde que se mudou para lá, o
garoto era assediado pela professora. “Quando ela teve o primeiro contato
sexual comigo eu me senti bastante envergonhado daquela atitude”, comenta.
Segundo ele, a violência sexual acontecia
depois que o marido de Rafaela saia para trabalhar. “Ela me levava para a cama
dela e lá fazia comigo tudo o que tinha vontade”, afirma. No primeiro momento,
a família do produtor acreditava que ele era tratado na casa como um filho. Até
que, “aos 13 anos de idade, eu me tornei pai”.
Nessa época, Davi contou para a irmã como era
a sua vida na casa da professora. Foi quando a mãe soube dos abusos. A mãe,
“como qualquer mãe”, o tirou da casa. Mas Davi já tinha criado uma ligação com
a mulher que dele abusava sexualmente e enfrentou a família para voltar.
A relação com o marido e o ciúmes
Quando o assunto veio à tona, o marido de
Rafaela soube de toda a história, mas ficou ao lado dela. Os detalhes dessa
passagem, Davi explica que estão relatados no livro, mas explica que foi um
momento de tensão. “Quando o marido dela descobriu, ele ficou ao lado dela,
dando apoio e se manteve conivente, na época assustou muito minha família,
muito a sociedade, eu não tinha essa noção da conivência dele com ela, eu tinha
até um certo ciúmes dele”, relata.
Segundo Davi, o caso não se tornou um
escândalo na capital mineira, pois Rafaela era filha de um juiz, que trabalhava
no Fórum na época. Para o produtor, esse fato fez com que a mulher não fosse
penalizada pelo crime. Segundo conta, a Justiça não foi feita para ela, pois os
abusos foram cometidos por uma influente.
O casamento
“Depois quando se resolveu a situação da
forma dela e da forma que o pai dela colocou, aí o marido se separou dela”,
relata. “Eu voltei pra casa dela e aos poucos ela foi me assumindo perante a
sociedade”, completa. Aos 17, Davi foi instruído pelo pai de Rafaela a se
emancipar, “e aos 19 anos eu me casei com ela”.
Trinta dias após o casamento, Davi deixou
definitivamente a casa da professora. Ele conta que nessa época ele
"acordou" e percebeu todo o mal que Rafaela havia feito a ele.
Entretanto, ela demorou dois anos para assinar os papéis do divórcio.
O caso nunca foi julgado e, segundo o
produtor, todas as provas foram "apagadas". Davi diz que faz buscas
na Justiça pelo assunto, mas não há nenhuma denúncia e nenhum inquérito, mesmo
que arquivado, sobre a sua história. Para ele, tudo isso se à influência do pai
de Rafaela.
A vida dez anos depois da separação
Atualmente, eles não têm mais nenhum tipo de
contato, somente na Justiça, no processo no qual Davi tenta provar ser o pai do
filho de Rafaela. Ele diz que a professora soube do livro, mas nunca se
manifestou sobre a publicação.
A obra tem tido bons índices de venda,
conforme conta Davi. Além de trabalhar como produtor de teatro, ele tem um
site, onde mantém um blog. No espaço, ele fala de sua vida, de outros casos de
pedofilia e ainda conversa com pessoas que se sentem curiosas pela sua
história.
Em relação à paternidade, quando for
comprovado – e ele diz ter certeza de que isso vai acontecer – ele afirma que
vai resgatar o tempo que perdeu com o filho, “da mesma forma que eu resgatei
com a minha família”, afinal, foram oito anos mantido longe do convívio com os
pais e a irmã.
Esperança
Hoje, o processo de paternidade segue sob
segredo de Justiça, mas, segundo Davi, ele obteve sucesso em primeira
instância.
E é isso que ele espera agora para retomar
totalmente o controle da sua vida. O produtor pretende retomar a vida com o
suposto filho “com amor e carinho, se possível com acompanhamento psicológico e
terapia, pois acredito que vamos precisar”, explica. “Eu estou super ansioso
por esse momento”, diz com a voz alegre e cheia de esperança.
O livro Tia Rafaela foi lançado oficialmente no dia 24 de setembro deste ano, pela editora Panda Books.