Bate-boca, ironia e diretores de grandes empresas constrangidos. Assim foi a apresentação dos investidores, encabeçados pelos bancos Banif e Bradesco, ao Conselho Deliberativo do Corinthians da proposta de construção de estádio na divisa entre São Paulo e Guarulhos.
O presidente do banco português Banif, Antônio Júlio Rodrigues, e executivos da construtora alemã Hochtief e da consultoria Pricewaterhousecoopers estiveram presentes no auditório do clube, mostraram três vídeos, mas talvez tivessem preferido ficar em casa. A reunião, que se estendeu por mais de três horas e foi acompanhada pela reportagem com autorização da presidência do Conselho, acabou marcada por momentos tensos entre os favoráveis e aqueles contra a oferta. Houve bate-boca entre o diretor de marketing, Luís Paulo Rosenberg, e o conselheiro Edgar Soares, um dos intermediários dos investidores.
“Não podemos aceitar uma proposta de estádio goela abaixo”, disse Rosenberg, que por duas vezes subiu à tribuna para discursar. “Um projeto de mais de R$ 400 milhões tem que ser avaliado com cautela”, completou.
“É por isso que o Corinthians fará 100 anos e não tem um estádio”, retrucou Soares.
No meio do “tiroteio”, o presidente do Conselho, Carlos Senger, que convocou a reunião para os conselheiros ouvirem a oferta, não para aprová-la, definiu que duas comissões serão formadas, uma para análise dos documentos e outra a viabilidade financeira, e que o assunto voltará a ser discutido até 10 de agosto, prazo dado pelas empresas para a diretoria do Corinthians dizer sim ou não. Uma decisão só pode ser tomada com o aval do presidente Andrés Sanchez, que nesta segunda-feira viajou a Curitiba para se apresentar à seleção brasileira. Ele será o chefe de delegação na Copa do Mundo e só retorna a São Paulo após 11 de julho.
Questão financeira
Rosenberg é contra propostas para construção de estádio nos moldes apresentados pelo Banif e pelo Bradesco. Este banco entrou no projeto no início de maio, quase um ano depois da primeira conversa entre o Banif e Andrés Sanchez. No acordo, as empresas constroem o estádio, mas ficam com o lucro das vendas de cativas, lojas, áreas Vips e do “naming rights” – o estádio levaria o nome do Bradesco por dez anos. Os investidores lucrariam 20% o valor da obra (sobraria para eles algo em torno de R$ 155 milhões, numa previsão otimista). A construtora EIT também integra o grupo.
“Temos que avaliar se é válido receber um estádio de graça, sem preocupação nenhuma, seja para comprar terreno, aprovar escritura, essas coisas, ou procurar financiamento nosso, contratar uma construtora, e ter todo o lucro“, disse Rosenberg.
Ele admitiu que o clube tem mais três possibilidades: em Itaquera (a reportagem apurou que a construtora Odebrecht avalia a viabilidade de se construir no terreno onde hoje está o CT das categorias de base), uma ampliação do Parque São Jorge (algo improvável) e receber de graça um estádio que fosse construído pelo Governo (federal e estadual), provavelmente em Pirituba, na zona norte da capital, como plano B caso o Morumbi seja descartado para a Copa de 2014. “Estamos analisando tudo isso e vamos montar um relatório para saber qual saída é mais viável”, falou Rosenberg.
Essa declaração fez Edgar Soares ironizar. “Onde estão essas propostas? São só possibilidades. Hoje aqui temos uma oferta real. Não adianta ficar inventando que o presidente Lula vai construir um estádio para o Corinthians. Ele tem mais o que fazer”, disparou. Os simpatizantes de cada lado aplaudiam assim que seus representantes se pronunciavam.
E a presidência?
A polêmica se estendeu para a importância que a diretoria (leia-se Andrés Sanches) dá à oferta. Rosenberg e o primeiro vice-presidente, Manoel Felix Cintra, afirmaram que Sanchez tinha pouco conhecimento do projeto. Antonio Roque Citadini, que é da oposição, afirmou que o Conselho não podia discuti-lo antes da direção se posicionar.
Foi quando Edgar Ortiz, outro conselheiro pró-proposta, contou que estava autorizado por Sanchez para revelar os detalhes e que o próprio presidente havia participado da negociação de alguns pontos da proposta, como o fato de o clube ficar com 100% da receita da venda de camarotes, e não 50% como queriam as empresas. O iG teve acesso a uma carta de intenções, assinada por Sanchez em julho de 2009, que mostra que ele deu seu aval.
“Esse documento foi assinado na sede do Banif”, disse Ortiz.
O bate-boca e a insinuação de Citadini que o Conselho não tem que avaliar propostas irritou Carlos Senger. “Com todo o respeito aos investidores, aqui não tem idiotas. É o primeiro projeto concreto que vejo e o Conselho tem que conhecer”, disse Senger.
Na saída, os conselheiros estavam divididos. A reportagem ouviu 20 (foram mais de 100 presentes), aleatoriamente, e 12 se mostravam a favor, oito contra. Um deles, que pediu anonimato, definiu bem a noite. “Enquanto essa briga política continuar, meu bisneto não vai ver o Corinthians com um estádio”. Os investidores deixaram o clube sem dar entrevista.
Apresentação de projeto de estádio corintiano tem ironia, bate-boca e constrangimento
Apresentação de projeto de estádio corintiano tem ironia, bate-boca e constrangimento
