No Pará, 98% das mortes no campo ficam impunes
Crimes

Um
levantamento inédito do governo federal mostra que quase 98% dos casos de
assassinatos no campo do Pará ocorridos nos últimos dez anos ficaram impunes.
Foram
analisadas 180 situações que resultaram em 219 mortes no Estado, entre 2001 e
2010.
Apenas
quatro (2,2%) delas geraram boletins de ocorrência, inquéritos policiais,
denúncias de promotorias, processos judiciais e, por fim, alguma condenação.
Outros
três casos chegaram a ser julgados, mas os réus foram absolvidos.
O
trabalho, desenvolvido pela Ouvidoria Agrária Nacional e Ouvidoria Nacional de
Direitos Humanos da Presidência da República, mostra também que a maioria dos
assassinatos no campo paraense (61%) não chega à Justiça. Dois em cada dez
casos nem foram investigados.
O
levantamento indica que a maioria das mortes (162) têm relação com disputas por
terras e recursos naturais, como madeira.
Além
do Pará, as ouvidorias analisaram também as mortes ocorridas no campo de Mato
Grosso e Rondônia.
Na
zona rural de Rondônia foram 47 situações, em que 71 pessoas foram mortas.
Quase a metade (45%) gerou processos e em apenas 13% delas houve condenação.
No
Mato Grosso, foram 50 mortes em 31 casos --58% chegaram à Justiça, mas 90%
continuam impunes.
Os
dados serão entregues a governadores, Tribunais de Justiça e Ministério
Públicos de Estados da Amazônia Legal, na tentativa de pressioná-los a acelerar
apurações ou julgamentos do crimes.
Nas
últimas duas semanas, o governo vem tentando responder à sequência de
assassinatos de líderes extrativistas e trabalhadores rurais na Amazônia.
Apenas no Pará foram quatro mortes.
Michel
Misse, do Núcleo de Estudos em Cidadania, Conflito e Violência Urbana da UFRJ
(Universidade Federal do Rio de Janeiro) e autor de um dos poucos estudos
empíricos sobre o tema, afirma que os índices revelados pelo levantamento são
"absurdos" e cita duas hipóteses para explicar o cenário de
impunidade.
A
primeira é a existência de uma "rede" que liga os operadores do
sistema penal, como policiais, juízes e promotores, aos criminosos. A segunda é
o medo dos operadores independentes de desafiar essa "rede".
"Não
acredito em ausência estatal. Pode ter uma presença fraca, incompetente ou
cúmplice, mas tem."